quinta-feira, 15 de novembro de 2007

A União faz a Força X A Força faz a União

Não posso precisar o ano, mas foi quando tive a oportunidade de, por algum tempo, estudar no IAE. Se a data me escapa da memória, não acontece o mesmo com a palestra proferida pelo professor e doutor Belizário Marques. Falava sobre a importância da união entre as pessoas em busca de um objetivo comum e para ilustrar chamou um dos alunos mais fortes do colégio e entregou-lhe uma vara fina para que a quebrasse. A varinha foi quebrada com facilidade. Depois lhe passou duas varinhas que também sofreram o mesmo que a primeira. Três varinhas, quatro, a dificuldade foi aumentando e assim por diante até o momento no qual nosso colega, apesar de seu grande esforço se deu por vencido, pois aquelas varinhas juntas ofereceram uma resistência que superou a força daquele forte aluno convocado para desafio. Sem dúvida, uma ilustração simples, porém prática e de fácil assimilação e lembrança.

Provavelmente muitos já pronunciaram um provérbio popular de caráter prático afirmando que “a união faz a força”. Se muitos já a pronunciaram, quantos, quem sabe, já a vivenciaram experimentando a gratificante recompensa do esforço conjunto? Afinal, tentar unir o diferente pensamento das pessoas tendo por objetivo a concentração do empenho e distribuição ordenada da força é uma tarefa muito complicada. Não é próprio do ser humano o trabalho em equipe. Sua natureza tende para esforços e conquistas individuais. Talvez seja esse o motivo pelo qual, muitos líderes incapazes de motivar seus liderados ao esforço conjunto, usam a força, o poder tendo em vista resultados, principalmente aqueles que aos olhos e julgamento humanos, satisfazem o desejo de prevalência.

Entretanto, poderia isso acontecer na vida de um pastor? Estaria ele sujeito a tal tentação? Não é ele o “ungido do Senhor” chamado para o exercício do ministério do amor? Seria possível um obreiro na Causa de Deus se esquecer da oportuna admoestação de Cristo de que “quem quiser ser o primeiro entre vós será servo de todos?” (Marcos 10:44). Não seria estranho alguém que deveria ser o exemplo na prestação de serviços ao rebanho do Bom Pastor, atuar de maneira oposta à de seu Mestre e Senhor?

O Vírus do poder

Retoricamente todas as questões acima podem ser respondidas com prontidão, pois também o pastor é um ser humano sujeito a tropeços no exercício de seu ministério. No entanto, se com rapidez podemos oferecer respostas às questões propostas, é muito mais complicado, na prática, oferecermos resistência ao insidioso vírus do poder. Esse vírus atua sutilmente e pode se instalar facilmente no coração de qualquer um de nós, quer seja nos relacionamentos familiares, profissionais, esportivos, escolares ou mesmo quando nos relacionamos dentro de uma comunidade eclesiástica. Assim, mesmo entre “irmãos” na fé, a disputa pelo poder pode ocorrer.

Em se tratando do pastor, qualquer que seja a posição que esteja ocupando, pelo fato de ser um líder e estar à frente das pessoas, torna-se um alvo fácil dessa perigosa doença cuja característica principal é a de se considerar superior às pessoas a quem deve indicar o rumo a seguir. Afinal, não são os liderados dependentes de seu conhecimento, de sua capacidade, de sua visão e de suas estratégias para que possam atingir os objetivos em vista?

Considerando que os pastores em geral, aqueles que lidam diretamente com os membros de igrejas, são suscetíveis à contaminação pelo vírus do poder, quanto mais aqueles que ocupam cargos administrativos na Causa do Senhor. Pastores distritais se relacionam com pessoas voluntárias e, portanto dependem de sua boa vontade e disposição para a consecução de seus alvos. Tal empreita requer tato e sabedoria e omitir isso de seu ministério, é com certeza uma afronta à dignidade de seus irmãos na fé. Por sua vez, ao lidarem com obreiros assalariados, administradores e departamentais, hierarquicamente sob o ponto de vista humano, estão acima de seus companheiros e, portanto, pesa sobre seus ombros a responsabilidade de atribuir um sentido à sua missão. Por isso, sentindo-se no direito, cumpre seu dever usando recursos muitas vezes infectados pelo poder para exigir um trabalho à altura do salário que recebem.

Sob o ponto de vista humano! É exatamente por aí que o problema começa. O obreiro está a ponto de se contaminar com o vírus do poder quando se acha ou, pior ainda, trabalha para ser “promovido”, elevado a um cargo cuja responsabilidade agora é indicar o rumo a seguir tendo em vista o “progresso da Obra”. Sendo guindado a um posto de liderança pastoral, como pode permitir que um obreiro tenha idéias próprias e desenvolva planos que considera serem mais adequados ao seu distrito? Afinal de contas, não foi o fato de ser considerado o mais talentoso, o mais capaz, enfim, o melhor, que o elevou ao cargo que ora ocupa? Pior ainda se foi elevado ao posto mais alto como resultado de conchavos políticos que, lamentavelmente acontecem na Obra do Senhor. Como afirmamos acima, o vírus do poder é insidioso, traiçoeiro e sua atuação é sutil, ocorrendo imperceptivelmente e muitas vezes sob o manto da racionalização.

Embora constantemente atacada, a Sra. White faz contundentes advertências quanto ao perigo do exercício do poder. Entre suas advertências temos:

“O poder despótico que se tem desenvolvido, como se a posição tivesse feito dos homens deuses, faz-me temer, e deveria causar temor. É uma maldição onde quer e por quem quer que seja exercido. Esse domínio sobre a herança de Deus criará tal desagrado da jurisdição humana que resultará um estado de insubordinação. O povo está aprendendo que não se pode confiar aos homens que detêm elevadas posições de responsabilidade formar e moldar o espírito e o caráter de outros homens. O resultado será a perda da confiança até mesmo na liderança de homens fiéis”. Testemunhos para Ministros e Obreiros Evangélicos, pág. 361.(destaque acrescentado).

Na primeira frase dessa pesada advertência, Ellen White nos conduz à compreensão de como, em muitos casos, as pessoas que chegam à posição de líderes se autojustificam para o exercício do poder despótico fazendo valer o adágio popular (A união faz a força), mas em seu sentido inverso, ou seja: “A força faz a união”. Imaginam-se fazendo a “Obra do Senhor” e assim, através de seus atos e atitudes, distorcem outra gema da sabedoria popular (Os fins não justificam os meios) deixando claro que, para esse modelo de liderança “os fins justificam os meios”.
No Manuscrito 140, de 1902, à página 65 do livro Liderança Cristã, editado pelo Centro de Pesquisas Ellen G. White, edição de 1988, a Mensageira do Senhor, estabelecendo “Princípios para Guia de Homens que Estão em Posição de Responsabilidade”, indica o rumo a seguir apontando também para o perigo de se desconsiderar tais advertências:

“Não carregareis convosco nenhum jugo para atares homens a vossos planos, nem tentareis transformar os obreiros do Senhor receptivos a qualquer mente finita. As máximas e preceitos de homens não devem controlar Seus obreiros. Que nenhum homem coloque-se em posição onde possa dominar sobre a herança do Senhor, pois isso põe em risco a alma do que domina e daqueles que estão sob seu governo”.

O desafio de ser um verdadeiro pastor

Liderar o rebanho do Senhor (seja esse rebanho um agrupamento de homens e mulheres voluntários como é o caso do pastor distrital, ou o corpo de obreiros assalariados de uma associação), pressupõe o exercício da autoridade conferida a todo aquele que de coração se alista no Exército do Grande Comandante.

Se uma visão distorcida acerca da liderança pastoral ou mesmo administrativa “põem em risco a alma do que domina e daqueles que estão sob seu governo”, quando devidamente ajustada promove resultados incalculáveis. O apóstolo Paulo nos garante isso mediante as palavras endereçadas ao jovem pastor Timóteo e a todos que se sentem chamados ao santo ministério. Suas palavras em 1 Timóteo 4:12 a 16:

“Ninguém despreze a tua mocidade; pelo contrário, torna-te padrão dos fiéis, na palavra, no procedimento, no amor, na fé, na pureza. Até à minha chegada, aplica-te à leitura, à exortação, ao ensino. Não te faças negligente para com o dom que há em ti, o qual te foi concedido mediante profecia, com a imposição das mãos do presbitério. Medita estas coisas e nelas sê diligente, para que o teu progresso a todos seja manifesto. Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Continua nestes deveres; porque, fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes”.

A primeira frase da passagem acima indiretamente insta os pastores ao exercício da autoridade não através da força manipulatória, mas exemplificando a pureza, a fé e o amor na maneira de falar e agir. Pastores, departamentais ou administradores que agem em consonância aos ditames da Palavra de Deus alcançarão êxito em seu ministério não pelos resultados numéricos alcançados, mas pela transformação de vidas motivadas pelo exemplo fiel de um servo que se dispôs seguir as ordens de Grande Comandante.

Ser um Pastor de verdade, é sem dúvida alguma, um tremendo desafio! Não um sargento autoritário que mobiliza seus comandados ao trabalho forçado visando resultados para projetá-lo aos olhos de seus “superiores”. Ser Pastor, que responsabilidade! Um general, sim, por quem os soldados sob sua liderança ousem dedicar sua vida pela Causa de Cristo, o Grande Comandante cujo sangue derramado na batalha contra o mal foi para a salvação daquele que nEle crê.

O perigo infeccioso do vírus do poder

Quando um obreiro é atingido pelo vírus do poder, consciente ou inconscientemente, age em função de seus impulsos egocêntricos. Estes são próprios da natureza carnal que teimosamente porfia pela pelo governo de nossa vida. Ao discorrermos sobre o uso do poder no desempenho da função pastoral não tivemos a pretensão de generalizar tal procedimento e sim o de considerar a nossa fragilidade ante as ameaças que rondam o ministério, visando o descrédito de nossa pregação.

Com certeza, existem pastores, departamentais e administradores que honram a função que desempenham, mas a tendência acentuada na prática do poder pode estar causando danos à Causa de Cristo. Primeiro porque tal procedimento é uma clara negação da fé no Grande Comandante e também porque “o resultado será a perda da confiança até mesmo na liderança de homens fiéis” como declara a Sra. White. Assim, o uso do autoritarismo, qualquer que seja sua estratégia, pode causar prejuízo nas fileiras do Exército do Senhor. Quem, senão Satanás, deseja insidiosamente minar a influência do ministério?

Em outras palavras, poderá ocorrer que, em nome do Senhor, o líder autoritário esteja inconscientemente atuando a serviço do inimigo. Já aconteceu no passado quando, em nome de Deus, os “santos padres” perseguiam os fiéis cristãos. Claro que a comparação é dura como o golpe de um “peso pesado” e difícil de se imaginar em nosso meio, mas não impossível. Isto porque as declarações de Ellen White já em 1899 já apontavam nessa direção. No Manuscrito 143, , publicado no livro Liderança Cristão, página 56, lemos: “Foi-me mostrado que os seres humanos desejam poder em demasia. Desejam controlar e o Senhor Deus, o poderoso obreiro, é omitido de seu trabalho. Os obreiros sentem-se qualificados para assumirem o lugar mais elevado”.

Tais palavras contêm um significado deveras significativo, pois trazem à lembrança o personagem que, em seu sonho de exaltação cobiçou a posição e o poder que eram próprios do Filho de Deus. Com isso promoveu a corrupção de uma terça parte dos anjos celestiais. Portanto, o desejo ardente de poder é um vírus de procedência maligna, satânica, contra o qual os líderes devem se precaver.

Fortalecendo o sistema imunológico da alma

Sendo um fato que temos uma natureza carnal propensa ao pecado, torna-se imprescindível a necessidade de uma vacina cujo efeito neutralize a influência do mal em nossa vida, em especial no exercício de ministério. Pensando bem, manter sob controle as tendências egocêntricas das quais eclodem a cobiça e o ardente desejo de poder para tornar-se um “padrão dos fiéis, na palavra, no procedimento, no amor, na fé, na pureza” é, sem sombras de dúvida, uma tarefa que está além das forças humanas.

Portadores dessa natureza chamada “carnal”, importa que a mesma seja subjugada pela natureza espiritual. Isso é possível mediante íntima comunhão com Deus visando o fortalecimento do sistema imunológico. O estudo da Bíblia e oração manterá um proveitoso relacionamento com Cristo à semelhança de João que, sendo “filho do trovão” se tornou no “apóstolo do amor”. As palavras de Ellen White são apropriadas:

“As lições de Cristo, apresentando a mansidão, humildade e amor como essenciais ao crescimento na graça e como condição para Seu trabalho, foram do mais alto valor para João. Ele entesourou cada lição, e constantemente procurava levar sua vida em harmonia com o divino padrão. João tinha começado a discernir a glória de Cristo - não a pompa e o poder terrenos que tinha sido ensinado a esperar, mas "a glória do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade". João 1:14. Atos dos Apóstolos, página 544.

O Salmo 34:5 aponta para o caminho de um ministério exercido com a verdadeira e abençoada autoridade. Diz o salmista: “Contemplai-O e sereis iluminados, e o vosso rosto jamais sofrerá vexame”. A contemplação de Cristo, o Líder por excelência, eis a vacina para fortalecer o sistema imunológico do pastor, seja ele distrital, departamental ou administrador, contra a infecção pelo vírus do poder. Que Deus conceda graça e poder, sim, mas principalmente humildade para seguir o exemplo do grande, maravilhoso e Bom Pastor, Jesus Cristo. Amém!